segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

Os cínicos e o cigarro

Esquerda, volver!


Avelino Ferreira


Está provado: o cigarro dá muito prazer, ao mesmo tempo que provoca males. Aliás, como o açúcar, a gordura, o álcool. Mas, dizem os estudiosos, o fumo dá muito mais prazer que as outras drogas e, por isso, é mais difícil deixar de fumar que deixar o crack, a cocaína, a maconha, a gordura, a carne bovina, o álcool etc..


No que tange ao fumo, parece que tudo começou com os tupinambás, que pitavam um cigarrinho de fumo de rolo, fato que foi motivo de relato do capelão da primeira expedição francesa ao Brasil, em 1556, segundo conta Mário César Carvalho no seu livro O Cigarro. O autor omite que não foi o câncer que dizimou os índios, mas sim as armas de fogo.

As invasões européias à terra da Santa Cruz permitiram aos brancos experimentarem um fuminho e, como gostaram muito de uma tragada, introduziram o produto do Novo Mundo em Portugal e Espanha. Depois, em outros países do Velho Mundo.

Fumar cigarro era raridade até o final do século 19. Em 1880, cerca de 58% dos usuários de tabaco eram mascadores de fumo, 38% fumavam charuto ou cachimbo, 3% cheiravam rapé e apenas 1% era fumante de cigarro. Nesse ano, o americano James A. Bonsack inventou uma máquina capaz de enrolar 200 cigarros por minuto, o que criou condições para o aparecimento da indústria de cigarro.

Durante a I Guerra Mundial, os soldados recebiam cigarros. Era uma maneira de diminuir a tensão, a ansiedade, e seu uso, que se achava restrito às camadas marginais das sociedades americana e européia, explodiu. Em 1900, o consumo anual americano era de cerca de 2 bilhões de cigarros; em 1930, chegou a 200 bilhões. Após a II Grande Guerra o hábito de fumar se espalhou pelo mundo, envolta em glamour por Hollywood, como símbolo de modernidade.

Nas últimas décadas, no entanto, o fumante passou a ser olhado como criminoso. As leis foram se sucedendo e, cada vez mais duras, até o ponto da proibição total do fumo em locais fechados. Restou a rua, mas mesmo nela o fumante é olhado como um marginal. O Japão chegou ao extremo de considerar crime o ato de fumar. Mesmo na rua é proibido uma tragada. Além de ser multado, o infrator vai preso e fichado.

Todos que fumam e morrem de câncer, o motivo é o cigarro. Agora mesmo aproveitam a morte de Paulo Autran para espalhar aos quatro cantos que o ator morreu por causa do fumo. Os dados, segundo os denunciadores do fumo como mal do século, não mentem jamais: quem fuma tem mais chances de contrair doenças de pulmão que os “normais”; 15% dos dependentes do cigarro morrem de câncer e outros 15% morrem de enfisema pulmonar. E são 25 milhões de fumantes no Brasil. Só não revelam as pesquisas sobre as mortes provocadas por enfisema pulmonar, por câncer e por problemas de coração em não-fumantes.

Não sei o que nem quem está por trás dessa campanha contra o tabaco. São os mesmos que toleram a bebida e combatem a maconha. São os que fumam, bebem e se drogam (drogas legais e ilegais).

Quando Paulo Autran morreu, aos 85 anos de idade e trabalhando, um cínico apressou-se em dizer que foi o cigarro. Só não disse que ele chegou aos 85 anos muito bem em relação aos milhões que morrem antes. Muito antes. E morreu numa idade muito acima da média dos não fumantes. Para concluir: perguntaram a um japonês bastante idoso sobre o segredo de sua longevidade. O centenário japa respondeu, na bucha: “nunca fiz nada do que não gosto”.


*Jornalista, pós-graduado em Filosofia

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