quinta-feira, 13 de março de 2008

Está ali, ó, embaixo do tapete

 

Mal Traçadas

Thiago Freitas

eu

 

É só procurar que no final das contas sempre acha. Foi assim com o município de Campos dos Goytacazes, no Norte Fluminense, onde o prefeito foi afastado e metade do seu secretariado levada para a Polícia Federal, no Rio de Janeiro, com os bens apreendidos. O último escândalo de corrupção da “República do Chuvisco” está servindo para mostrar que ainda existe esperança para a sociedade brasileira, e um motivo para os gestores públicos terem medo, sim, de cometer excessos com a máquina pública. E é pegando carona nesse episódio que arrisco instigar uma ação como a feita em Campos, por parte do Ministério Público e da PF, aqui em Cabo Frio. Senhores, está logo ali, ó, bem embaixo do tapete.

Levantem os sofás dos gabinetes, vasculhem as gavetas da Câmara, ouçam as conversas telefônicas, porque por aqui também pode existir sujeira. Improbidade administrativa não é exclusividade dos municípios de Magé, Angra dos Reis, Silva Jardim, Campos etc.

Comecemos por algo simples. Favorecimento pessoal e nepotismo. É ou não é proibido por lei? É. Mas aqui isso é natural, e ninguém questiona. São “Mendes” e mais “Mendes” ocupando cargos administrativos no poder público municipal. É a famosa gestão familiar. O cara é eleito e mais da metade da família está empregada. Aonde? Na prefeitura, ué. Tem um gaiato desses que responde até por uma construtora. Que presta serviço para quem? Para prefeitura, ué.

Quando da demissão dos funcionários do quadro do governo que pertenciam ao grupo de Alair Corrêa, o ex-prefeito, a lista era mais do que uma lista de exoneração motivada por racha político, era um tiro no pé de ambos os gestores, do antigo e do atual: uma avalanche de “Corrêas”, uns com parentesco mesmo, outros, sim, por mera coincidência. Mas ninguém chiou. Bom lembrar: nenhum concursado entre os citados.

Enriquecimento ilícito. Creio que os automóveis luxuosos em que andam vários figurões do governo não são, de forma alguma, carros com valores compatíveis com os salários que recebem pelos  serviços prestados à população. Salários esses pagos por ela. Um salário de vereador, secretário, prefeito, seja lá o que for, não arca com as despesas de Hondas Civics, Eco Sports ou caminhonetes avaliadas em mais de R$ 70 mil, isso sem falar em emissoras de TV, jornal, fazendas de avestruz e o escambau. “Mas eles têm profissão”, dirão. “Eu sou médico”, dirá um, “eu sou engenheiro”, argumentará outro, “e eu advogado; é de onde arranco meus proventos”, se defenderá um terceiro. Mas o dia só tem 24 horas, a menos que sejam onipresentes para darem conta de administrar um município com 160 mil pessoas e trabalharem em suas empresas particulares. E ninguém chia. Nem o MP. O que houve, afinal, Cabo Frio não está no mapa?

[Vasculhem, revirem, levantem os tapetes do poder. Vocês vão achar casos muito, muito parecidos com os de Campos]

Vasculhem, revirem, levantem os tapetes do poder. Vocês vão achar casos muito, muito parecidos com os de Campos. Obras com licitação irregular? Superfaturamento? Desperdício de dinheiro público? Serviços mal prestados? Contratações irregulares? Vasculhem, revirem, levantem os tapetes do poder. Cadê os R$ 500 milhões? Para onde foram? Quando acharem algo comprometedor, me chamem. Estarei lá para retratar que o Brasil não é mais o país da impunidade.

 

*Jornalista

quinta-feira, 6 de março de 2008

Estou nessa boca

Na toca com o lobo

Fausto Wolff

O TEMPO passa para todos. Para uns, correndo, e para outros, em marcha lenta. Passa devagar para quem está preso e mais devagar para quem está sendo torturado; não acaba nunca para o operário, que tem de tomar três conduções para descansar em casa por algumas horas, que, essas sim, passam rapidamente. Já para as crianças em geral, o Natal parece demorar demais. No mundo da política, ou seja, do crime oficialmente organizado, as coisas são rápidas. Depois que FHC comprou do Congresso o segundo mandato, todo presidente eleito só pensa em fazer algo no fim do primeiro mandato. Por exemplo: aumentar em uma miséria o salário dos pequenos funcionários públicos, que, como ganham uma miséria, não têm tempo para o público. No segundo mandato ele não fará nada, a não ser que consiga comprar um terceiro.

Para o jornalista, o tempo passa rapidamente demais. Ele esquece hoje o nome do ladrão de ontem. Quando eu ajudava o Jaguar a editar o Pasquim, no tempo das Diretas-Já, sabedores de que é impossível guardar o nome de todos os políticos que trabalham contra o povo, decidimos fazer uma eleição. Leitores de todo o país responderam à pergunta: "Qual o político mais corrupto do Brasil?" Achávamos que Maluf seria barbada. Mas o Pará em peso deve ter votado e deu Jader Barbalho por focinho. E eles eram jovens, sabiam que um futuro sórdido e lucrativo os esperava. Maluf passou alguns dias na cadeia e acha que não deve nada à Justiça: nem os milhões de dólares que mantém em bancos estrangeiros. Ao contrário, diz que Lula lhe deve um favor, pois sua prisão tirou das manchetes por alguns dias a turma do mensalão. Alguém lembra os nomes dos meliantes? Mas o que digo? Meliantes? Posso ser processado, pois os nobres deputados, como gostam de ser chamados, absolveram todos os mensalonários, menos três. Estão soltos e com o dinheiro roubado certamente se reelegerão. Jader Barbalho tem feito low profile, ou seja, tem ganhado sem trabalhar, onerando assim, por incrível que pareça, um pouco menos o Tesouro nacional. Chegou a usar algemas por alguns minutos, mas logo um juiz bondoso mandou acabar com aquela maldade. Acha que por causa dessa rápida humilhação já pagou pelo dinheiro surrupiado.

A emenda Dante de Oliveira, que pedia as diretas, foi vitoriosa (222 x 65 votos), mas rejeitada por falta de quórum. Diante disso, eu e o Jaguar publicamos no Pasquim as fotos 3x4 dos congressistas que haviam votado contra as diretas. Eram apenas 65 descarados. Os demais não foram, daí a falta de quórum. Publicamos as fotos para que ninguém se esquecesse dos facínoras. Hoje só me lembro do nome do bizarro ex-maoísta Moreira Franco. Ou foi o Medina? Todos sabiam que, nas eleições indiretas, o Tancredo Neves, um conciliador, seria barbada contra o Maluf, que nem Figueiredo queria. Eu, porém, lembrei no Pasquim que tramitava na Câmara a emenda Theodoro Mendes, que pedia eleição direta em dois turnos. Ou seja, poderíamos ter tido as diretas em 1984 e, em vez disso, tivemos o desgoverno de Sarney. Saiu tão impopular que foi se eleger pelo Amapá, onde era mais fácil.

Eta Brasilzinho bom: José Ribamar está em liberdade, impediu que o PMDB lançasse o nome de Simon para a Presidência e tem contas pendentes com a União superiores a R$ 1 bilhão. Já Alberto Capiberibe, senador amapaense pobre, honesto e nacionalista, foi cassado sob a denúncia de que teria pago R$ 28 por um voto. Como o tempo passa depressa, ninguém se lembra mais do líder do governo no Senado. É o nosso velho conhecido Romero Jucá, de Roraima, homem de convicções tão rígidas que foi líder de Fernando Henrique Cardoso no Senado. Foi obrigado a deixar o Ministério de Lula por irregularidades cometidas quando era governador. Por irregularidades entenda-se... Ah, esqueçam e cantem comigo: "Eu também estou aí, estou aí, o que é que há, estou aí nessa boca. Muita bebida, mulher sobrando, tem até trouxa nesse samba se arrumando". E o tempo passa.

faustowolf f@jb.com.br

quarta-feira, 5 de março de 2008

Caros leitores

Quando eu disse “caros leitores”, queria, na verdade, dizer “caros leitores e colaboradores”. Sim, porque disso é feito este blog, de pessoas que escrevem e de pessoas que lêem, e, no fim, tornam-se únicas pela magia da comunicação. É exatamente por essa razão que venho me comunicar com todos para informar o que deve ser não só de interesse, mas também de direito daqueles que adotaram o Lagos Alternativa como uma leitura (diária, semanal, mensal, esporádica, tanto faz).

De certo muitos devem ter se perguntado o que houve com o blog, já que ficou por um tempo desatualizado, sem novas postagens. É que começo a entender o quanto é difícil, sozinho, sustentar um veículo de comunicação, seja ele qual for. Exige tempo, dedicação, esforço, muito esforço. Exige se fortalecer, revisão de conceitos, busca de novos parâmetros. E, o principal, sustentabilidade. O que até o momento não existe. Mas que se dane! O projeto do blog era para ser isso mesmo, um jornalismo romântico que remonta o antigo e avança para um novo, quebrando os paradigmas formados nos últimos anos de imprensa.

Este breve comunicado, que já vai longe demais para o que deveria ser, tem uma função única: dizer que vamos fazer o possível para continuar, que não vamos esmorecer, principalmente num ano decisivo para a história política e cultural das inúmeras cidades que integram nossa região e de outras vizinhas. Vamos tocar o Lagos Alternativa. Vamos lutar para dar voz a todos que quiserem ser ouvidos. Vamos, assim mesmo, a reboque de exemplos como a turma do Pasquim, da Caros Amigos e de outros veículos alternativos (que sofreram e sofrem até hoje pela falta de grana), levando, empurrando... Deixemos para ver no que dá. Até porque, em várias fases da vida, tenho certeza de que todos vocês já se viram assim como eu, sempre no começo. E jornalismo é isso mesmo, um dia de cada vez.

Forte Abraço!

Thiago Freitas

Macérrimo: o que é isso, companheiro?

Ora, sim, pois, pois...

Eraldo Mai


Todos nós que cursamos as séries do Ensino Fundamental, também quando ele era conhecido por outros nomes (na minha época havia o curso primário e o ginasial), decoramos listas enfadonhas de formas superlativas referentes a diversos adjetivos da nossa língua. O superlativo, para quem não se lembra do que seja isso, é a forma que exprime a qualidade acrescida de uma idéia de intensificação. Assim, se digo que uma pessoa é bela, digo menos do que quando digo que ela é belíssima. A forma “belíssima” é, pois, uma forma superlativa, e equivale a “muito bela”, ou “bela paca”, de acordo com determinada variedade lingüística. Aliás, a expressão “bela paca”, descontextualizada, é ambígua: pode tratar-se de uma paca bonita ou do adjetivo “bela” superlativizado por meio de “paca”, resultado a aglutinação de “pra” com um substantivo de valor aumentativo terminado em “alho” (sutil, não?).

Pois bem, aprendemos que a maior parte das formas superlativas termina com o sufixo “íssimo”, e algumas em “rimo”, que, equivocadamente, muitos supõem ser “érrimo”. Essas formas superlativas em “rimo” resultam do acréscimo do sufixo a uma forma erudita latina terminada em “er”: “muito negro”, por exemplo, além de ser “negríssimo”, é também “nigérrimo” (forma superlativa erudita), uma vez que “negro”, em latim, é “niger”. No registro coloquial da língua, amiúde encontramos formas como “chiquérrimo”, “baratérrimo”, “fresquérrimo”, como se “érrimo” fosse um sufixo intensificador. Aliás, como se fosse não; ficou sendo. Parece que a força expressiva de tais formas suplanta a de “chiquíssimo”, “baratíssimo”, “fresquíssimo”, certamente pela sonoridade dos [rr] correspondentes a um fonema velar que rasga a garganta do falante, se levamos em conta a prosódia do falar carioca, não limitado ao perímetro da Cidade Maravilhosa.

Feitas essas considerações, pergunto ao leitor qual seria a forma superlativa do adjetivo “magro”. Tenho a mais absoluta certeza de que ele me dirá “magríssimo” ou “magérrimo”. Surpreenda-se, leitor, com a informação de que está tudo bem com a primeira forma superlativa (“magríssimo”), mas a segunda, talvez mais utilizada do que a primeira, considera-se um erro. Como? Sim, um erro. De acordo com os doutos, com os versados no vernáculo, “magérrimo” é uma corruptela de “macérrimo”, esta sim a forma superlativa legítima (erudita, certamente) de “magro”. A explicação é simples: “magro”, em latim, é “macer”, donde “macérrimo”. Quantas vezes em sua vida, caro leitor, você ouviu alguém referir-se a uma pessoa muito magra chamando-a de macérrima. Poucas, ou nenhuma, certamente. E qual seria a razão de o falante, que é você, esse competente utilizador do sistema da língua, ter substituído “macérrimo” por “magérrimo”? Por que as pessoas, inclusive as bem escolarizadas, as letradas, por que todas as pessoas normais dizem “magérrimo” e não “macérrimo”? Somos todos um bando de ignorantes da língua, nós que a usamos como instrumento vivo de nossa comunicação? Como entender o que houve e continua havendo?

Entro, então, eu com a minha tese. Já encontrei outras explicações. Numa delas, um professor da UFRGS, Cláudio Moreno, discípulo do grande Celso Pedro Luft, explica a forma superlativa “magérrimo” como o resultado de um processo analógico. A analogia teria ocorrido com a forma “nigérrimo”, que, nesta matéria, mencionei. Com a devida vênia, discordo do eminente professor, até porque o usuário comum da língua não emprega a forma superlativa erudita do adjetivo “negro”. Nunca ouvi ninguém dizer que a pele de alguém é nigérrima. Como supor que “magérrimo” resulte de uma analogia com uma forma que o falante não utiliza?

A explicação, segundo o que intuo, é de outro jaez. Quero crer que a coisa passe pela questão estilística. As palavras são conjuntos de sons que veiculam um significado. Ora, há palavras cujo significado parece anunciar-se em sua massa sonora. Se digo, por exemplo, “O rapaz escapou por um tris do atropelamento”, uso uma palavra de expressivíssima sonoridade, a palavra “tris”. É como se meu interlocutor pudesse ver o rapaz quase sendo atropelado. Aquele fonema /i/ posposto ao grupo consonantal /tr/ do monossílabo nos dá nitidamente a idéia de um átimo de tempo.

Seguindo essa linha de raciocínio, observe-se a palavra “macérrimo”. A letra [c], em tal vocábulo, corresponde à fricativa /s/, sibilante. Tem o mesmo valor fonético dos [ss] da palavra “massa”. Assim, como não associar, quando escutamos “macérrimo”, o significado dessa palavra ao de “massa”? Fica a impressão de que uma pessoa macérrima é uma pessoa com muita massa, marombada, como se diria numa variedade saborosíssima da língua portuguesa. É como se o significante (a estrutura sonora da palavra) contradissesse o seu significado, porque uma pessoa macérrima tem pouca massa, já que é muito magra.

O falante, com sua sabedoria inata, substituiu o fonema /s/ de “macérrimo” pelo som correspondente ao da letra [j], mesmo som correspondente ao da letra [g] em “magérrimo”. Ao ouvir que alguém está magérrimo, o som do [g] sugere um desmilingüir-se, vocábulo também de massa sonora bem expressiva. “Magérrimo”, pelo caráter fricativo do fonema correspondente à letra [g], lembra a massa corpórea que se esvai, tornando esquálido o corpo, muito magro, portanto.

Se minha análise terá algum fundamento científico não sei. Sei que curti muito fazê-la. Espero que o leitor tenha embarcado comigo nessa viagem.



*Poeta e professor de Língua Portuguesa da Ferlagos

Conversos


Eraldo Mai

Certeza

Esta alegria é Deus
Este conforto imenso é Deus
Esta paz é Deus
Este estar pronto para a poesia é Deus
Este abrir-me ao próximo
Este cantar interno
Este olhar para as coisas com doçura
É Deus

É Deus sim
Que tem vindo amiúde com zelos de Deus
Afagar seu filho
É Deus sim
Que Se tem mostrado generoso
Tem me ensinado tanto
E feito dos meus momentos
Louvação constante

É Deus a todo instante
Me querendo bem
Sem motivo
Só porque Ele é bom


Posse

Eu dizia meu Deus
Sentimento de posse

Passava a dizer nosso Deus
Ainda sentimento de posse

Então dizia Deus
Assim o aprisionava

Agora mergulhar no silêncioSorvendo Deus sem palavras


*Poeta e professor de Língua Portuguesa da Ferlagos