sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

A liberdade de escrever



Nossa Imprensa

Octavio Perelló

Por falta de outro que atendesse à idéia deste artigo, afanei o título acima. Roubei-o de um livro que considero obra capital de Erico Veríssimo, A liberdade de escrever – Entrevistas sobre literatura e política (Editor Globo, 1999, 210 páginas). Com apresentação de Luis Fernando Veríssimo e organização de Maria da Glória Bordini, trata-se da compilação de parte substancial do pensamento do escritor, em reunião de entrevistas memoráveis. Erico Veríssimo, este que, como poucos, viveu de literatura, nos legando sua ficção monumental e um punhado de opiniões e posicionamentos corajosos.

Os livros, sem exagero, são o que detém a liberdade do planeta. Não se iludam, meus parcos e pacientes leitores, não há liberdade total, em nenhuma mídia, senão nos livros. Os ideais mais libertários, desde o advento do livro, estão impressos nestes, e não há jornal que o conteste. As artes são livres e libertárias, mas as letras impressas nas páginas dos livros são mais, estejam reportando fatos reais ou costurando narrativas de ficção. A literatura, em seu sentido bibliográfico, não é somente linguagem, carrega a língua documentada. É nesta fonte que bebemos desde as primeiras letras.

Neste exato momento, ao traçar estas modestas linhas, não posso acreditar que a Internet é um canal de livre expressão. Sinceramente, não é. Mesmo que sejam acessados de forma democrática, sites e blogs são regulados, em seu conteúdo, pelo dispositivo invisível da censura, seja da autocensura do escriba ou da tesoura do editor. Afinal, há limites que se impõem pelo respeito ao leitor, coisa que nos livros não ocorre. Por sua verve libertária, são os livros os maiores alvos de censura em toda a História, desde as fogueiras medievais que, além de páginas e encadernações, também esturricaram muitos autores. Desde os romances picantes que ruborizaram moças curiosas, até as mais contundentes idéias publicadas que abalaram o mundo e o transformaram.

Ao longo da História avança e recua a imprensa, mesmo escrevendo páginas importantes. Evidentemente que sempre houve a imprensa resistente a políticas totalitárias e arbitrárias – um ou outro segmento sobrevivendo às margens do sistema. Porém, muito antes da primeira pressão ou do primeiro atentado a uma redação, os livros já haviam freqüentado imensas fogueiras. Estes sim nos legam o conhecimento de muitos séculos. O legado religioso e científico nos foi trazido pelos livros; as ideologias perduraram mais pelos livros do que pelos sistemas que implantaram. A liberdade de escrever jamais foi tão suprema em outro território.

Não pretendo, com estas opiniões, aprisionar a atuação da imprensa nas masmorras perpétuas do sistema. Apenas externo uma reflexão que sempre me acompanha sobre a liberdade de escrever. Não me refiro à liberdade de falar, inclusive de caluniar ou exagerar em elogios, mas sim da incomensurável liberdade de escrever, que maior não há do que nos livros, na literatura.



* Jornalista, arquivista, especializado em Gestão de Centros de Documentação e Informação, atualmente diretor-geral da Câmara Municipal de Cabo Frio e colaborador da Revista Cidade, com passagens por importantes assessorias de imprensa e agências do Rio de Janeiro, tais como Bradesco Seguros e Previdência, Básica Comunicação, Shopping de Comunicação e FSB Comunicações, e veículos, agências e assessorias de imprensa do interior do Estado, como Folha dos Lagos, O Canal, Cox Propaganda, Humanóides Produtora, Prolagos e Prefeitura de Búzios. Autor de Memórias de um mouro (Prêmio IV Concurso de Contos da Prefeitura de Niterói, publicado pela Niterói Livros em 2006) e Colóquios de Vespúcio e Colombo (Prêmio Teixeira e Souza de Literatura 2003 / Prefeitura de Cabo Frio).

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